Tuesday, February 19, 2008

o eterno inferno

Saí da minha insana solidão, e lá fui gordo e lá me arrastei por entre o branco do passeio e o negro da noite rua abaixo rua até ao rio, onde a escuridão alcança diversos niveis, entre sombras e àgua, entre demonios e pedras... o cheiro a algas parece querer misturar-se com o frio da noite, e o que por outras vezes até pudesse ser algo que me inspirasse na vossa companhia, é agora mais um vidro que vais rasgando por dentro... vou andando junto ao rio, apreciando cada detalhe, desde o vazio das ruas, ao barulho dos cães que parecem rir-se de mim, até a luz intermitente e velha, terminando na areia, descalço e junto ao velho moliceiro esquecido e injustamente abandonado...é mais uma noite, mais um dia, e mesmo sabendo que é um dia que fico mais perto do fim e mais perto de vós, também sei que é mais um dia que fico mais longe das visões que amei e me apaixonei...sei que é mais um dia em que não sentirei o vosso abraço, o vosso calor o vosso carinho...é mais um dia nu, um dia em que as vossas faces passaram de estar ali para estar aqui, lá em todo o lado...
Levanto-me e sigo sem pensar em quem me vê ou quem me possa chamar... caminho na lama preta e por entre os restos de milhares de humanos que ignoram o que possam matar com o lixo, e no meio destra podridão e esquecimento do que foi o dia e do relembrar da solidão da noite...quase morro de frio, quase morro de dor...mas continuo, deixo-me molhar pela negra e gélida manta que me vai cobrindo o corpo e me vai impestando de um cheiro e me roubando a vida...fico por momentos debaixo de agua, quieto e morto para o mundo, a pensar se deixo fugir o ar que tenho na boca ou se volto à superficie...demonios e fadas inundam-me e deixo-me perder na insanidade do pensar no que quero e numa razão para viver...
Deixo-me voltar ao de cima, deixo-me boiar ignorando que seres poderão me devorar...sou arrastado até à margem e ali fico até ao primeiro raiar de sol...até uma gaivota branca cheia de cicratrizes começar a cantar e me lembrar que até os meio mortos podem viver...

Ontem hoje e sempre...o meu sangue não se esgota e a dor só aumenta...amanhã depois e pra sempre... a vida brota,o amor aguenta, e eu estarei aqui a honrar-vos...